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Chefe do Exército ucraniano revela estratégia por trás da invasão de Kursk

Oleksandr Syrskyi também comentou que Ucrânia precisa de mais tropas e equipamentos






A Rússia estava planejando lançar um novo ataque contra a Ucrânia a partir da região de Kursk, antes da invasão surpresa de Kiev, disse o comandante do Exército ucraniano, general Oleksandr Syrskyi, à CNN em uma entrevista exclusiva.

Em sua primeira entrevista à televisão desde que se tornou chefe militar, em fevereiro, o general disse a Christiane Amanpour, âncora da CNN, que acredita que a operação Kursk foi sido um sucesso.

“Isso reduziu a ameaça de uma ofensiva inimiga. Nós os impedimos de agir. Movemos a luta para o território inimigo para que [o inimigo] pudesse sentir o que sentimos todos os dias”, alegou Syrskyi.

No mês passado, as forças ucranianas invadiram Kursk em uma incursão que pegou até mesmo oficiais dos Estados Unidos de surpresa. Isso sinalizou que, apesar da vantagem da Rússia em termos de soldados e blindados, seus militares têm vulnerabilidades.

Principais objetivos da invasão

Syrskyi explicou à CNN os principais objetivos da operação em Kursk:

  • impedir a Rússia de usar Kursk como “plataforma de lançamento” para uma nova ofensiva
  • desviar as forças de Moscou de outras áreas
  • criar uma zona de segurança
  • impedir bombardeios transfronteiriços de alvos civis
  • capturar prisioneiros de guerra
  • e aumentar a moral das tropas ucranianas e da nação em geral

Falando com Amanpour em um local não revelado perto da linha de frente, o general afirmou que Moscou moveu dezenas de milhares de tropas para Kursk, incluindo algumas de suas melhores tropas de assalto aerotransportadas.

E embora tenha admitido que a Ucrânia estava sob imensa pressão na área ao redor de Pokrovsk, a cidade estratégica que há semanas é o epicentro da guerra no leste do país, Syrskyi comentou que suas tropas agora conseguiram impedir os avanços russos na região.

“Nos últimos seis dias, o inimigo não avançou um único metro na direção de Pokrovsk. Em outras palavras, nossa estratégia está funcionando”, disse ele.

“Nós tiramos a capacidade deles de manobrar e de implantar suas forças de reforço de outras direções… e esse enfraquecimento definitivamente foi sentido em outras áreas. Notamos que a quantidade de bombardeios de artilharia, bem como a intensidade da ofensiva, diminuíram”, disse ele.

Ucrânia tem menos armas e soldados

Antes da entrevista à CNN nesta quinta, Syrskyi havia inspecionado a linha de frente da batalha. Ele pontuou que não há dúvidas de que a Ucrânia tem menor número de armas e soldados, enquanto tenta se defender da agressão russa.

“O inimigo tem uma vantagem na aviação, em mísseis, em artilharia, na quantidade de munição que usa, é claro, em pessoal, tanques, veículos de combate de infantaria”, ponderou.

Militar ucraniano na região russa de Kursk • 16/8/2024 REUTERS/Yan Dobronosov

Mas Syrskyi também disse que o fato de a Rússia ter uma vantagem material forçou a Ucrânia a se tornar mais inteligente e eficiente na forma como está lutando a guerra.

“Não podemos lutar da mesma forma que eles, então devemos usar, antes de tudo, a abordagem mais eficaz, usar nossas forças e meios aproveitando ao máximo as características do terreno, estruturas de engenharia e, também, usar a superioridade técnica”, observou.

O general citou também o programa avançado de drones da Ucrânia e outras armas de alta tecnologia desenvolvidas internamente.

Momento crítico da guerra

Syrskyi foi nomeado comandante-chefe da Ucrânia em fevereiro, depois que o presidente Volodymyr Zelensky demitiu o general Valerii Zaluzhnyi. Ele assumiu em um momento particularmente difícil para a Ucrânia.

O atraso de meses na entrega de assistência militar dos Estados Unidos causaram escassez crítica de munição.

Ao mesmo tempo, a Ucrânia estava lutando para repor suas tropas, exaustas e abatidas após lutar contra a ofensiva implacável da Rússia por dois anos.

Syrskyi pontuou que recrutar mais soldados era uma prioridade. O governo ucraniano aprovou uma lei de mobilização controversa, exigindo que todos os homens entre 18 e 60 anos se registrassem nas Forças Armadas da Ucrânia e carregassem seus documentos de registro o tempo todo.

Essa neduda fez parte de um esforço para tornar o processo de recrutamento mais transparente e justo.

Sete meses depois, os novos recrutas estão chegando às linhas de frente, mas vários comandantes afirmaram à CNN que nem todos os novos soldados estão prontos para lutar e estão abandonando suas posições rotineiramente.

Syrskyi admitiu que suas tropas estão indo para o campo de batalha depois de receber menos treinamento do que ele gostaria.

“É claro que todos querem que o nível de treinamento seja o melhor, então treinamos pessoal militar profissional altamente qualificado”, ressaltou.

“Ao mesmo tempo, a dinâmica na frente exige que coloquemos os recrutas em serviço o mais rápido possível”, ponderou, explicando que os novos recrutas recebem um mês de treinamento militar básico seguido por meio mês a um mês inteiro de treinamento mais especializado antes de serem enviados para lutar.

Syrskyi comentou a Amanpour que os atrasos na assistência militar dos EUA causaram grandes contratempos no campo de batalha e levaram a uma queda na moral — algo que ele admitiu ainda ser um problema.

Ele disse que faz viagens frequentes para as linhas de frente e garante que passa tempo com suas tropas.

“Falamos a mesma língua… nos entendemos, não importa com quem eu esteja falando — seja um soldado comum, um atirador, por exemplo, ou um comandante de brigada ou um comandante de batalhão”, assegurou.

“Estou nessa guerra desde 2014”, observou, referindo-se à invasão da Rússia na região de Donbass há 10 anos.

“Em outras palavras, a linha de frente é minha vida. Nós nos entendemos, eu sei de todos os problemas que nossos militares, soldados e oficiais enfrentam”, adicionou.

Syrskyi encerrou a entrevista agradecendo aos aliados ocidentais da Ucrânia por seu apoio. Mudando do ucraniano para o inglês, ele disse: “Juntos somos mais fortes. Juntos podemos vencer”.

 

CNN Brasil